terça-feira, 1 de junho de 2010

Vamos lá ao Museu?...

“…Eu avanço com uma sugestão: Penso que o espaço indicado para a construção do prometido espaço museológico será o Palacete do Cais Velho de Alhos Vedros. Não haverá outro sítio no Concelho, onde se respirará com mais força os ecos da nossa história.”

Surgem estas palavras ainda na sequência do “Ponto de Encontro sobre a História”, um Encontro organizado pelos Amigos da História Local que decorreu no Centro Paroquial de Alhos Vedros, em Setembro passado.

Ali se anunciou o nascimento de uma nova associação cultural, Alius Vetus – Associação Cultural História e Património que, segundo as palavras de Vítor Cabral, aparece com os olhos postos no futuro, dada a proximidade da data em que Alhos Vedros comemorará os 500 anos da atribuição do Foral pelo rei D. Manuel I, na sua elevação a Vila.

Bem-vindo seja, pois, quem atempadamente se ocupa de tão dignos propósitos, sobretudo, porque está mais que na hora de valorizarmos o património histórico que temos entre mãos, porque é nosso, tem valor e não há razão para continuar encoberto e maltratado.

No referido “Encontro”, onde infelizmente só pudemos estar presentes nas comunicações da tarde, ouvimos o nosso estimado amigo António Ventura falar sobre “Alhos Vedros no contexto económico da margem esquerda do estuário no Antigo Regime (sécs. XVII e XVIII)”, onde numa palestra apoiada por documentação quanto baste, seriedade e rigor, nos foi dizendo do declínio económico que o Concelho de Alhos Vedros começou a revelar neste período. De tal forma que, como sabemos, no século XIX, depois de reformas políticas na reorganização administrativa do território, deixou de ser a sede de Concelho.

Mas como também referiu com clareza António Ventura, na parte introdutória da sua comunicação, foi grande a importância histórica que Alhos Vedros teve na região, nos três ou quatro séculos que antecederam esse declínio económico. Avançamos com alguns exemplos que justificam essa afirmação:
O valor da atribuição da carta de foral atribuída pelo rei em 1514; a grande importância que a região teve na expansão ultramarina; a suposta autoria de Álvaro Velho no “Roteiro”, título da crónica que relata a viagem de Vasco da Gama à Índia; o luto que o Rei D. João I cumpriu em Alhos Vedros, quando da morte da rainha Filipa de Lencastre, onde também vieram os seus filhos antes de partirem para a conquista de Ceuta – recordemos que um dos seus filhos era o Infante D. Henrique, a grande figura dos Descobrimentos Portugueses; os mais antigos registos escritos que existem da Igreja Matriz de Alhos Vedros, datados de finais do século XIII, mesmo não dando conta da sua real origem, já que são conhecidos relatos que vão até ao início da nacionalidade, como será o caso da lenda da Nossa Senhora dos Anjos, se bem que aqui os amigos historiadores talvez tenham dificuldade em chegar.

Já para os nossos amigos arqueólogos que muito trabalho têm desenvolvido pelo Concelho, essas dificuldades não se põem, pois que os vestígios encontrados apontam para uma ocupação humana destes lugares há, pelo menos, 5 ou 6 mil anos. Destaquemos aqui, nas várias escavações que têm sido efectuadas por cá, o trabalho de António González que com poucos apoios, mas muita vontade, tem possibilitado um conhecimento mais alargado do passado da nossa região. E diga-se, para bem da verdade, começou González todo este trabalho, numas escavações que decorreram à volta da Igreja Matriz de Alhos Vedros, onde então pode contar com o apoio e a colaboração da Cooperativa de Animação Cultural (CACAV).

Entre historiadores e arqueólogos, também não queremos deixar de elogiar as pesquisas desenvolvidas por José Manuel Vargas que, embora não tenhamos tido a possibilidade de ouvir neste encontro, já tivemos oportunidade de o escutar várias vezes e até de ter lido farta documentação sobre o assunto por ele desenvolvida.

Diga-se também que, aqui e ali, tem vindo a Autarquia a apoiar algumas iniciativas nos estudos da história local, mas que muito mais seria de esperar por parte de quem tem a responsabilidade política dos destinos da região, faz muitos anos. Em abono da verdade, deveremos dizer que temos verificado alguma manifesta insensibilidade, por parte dos responsáveis autárquicos, no que toca à preservação do património histórico do Concelho. Tanto quanto sabemos, e até pode ser que saibamos pouco, muito reduzida tem sido a inventariação, sinalização ou identificação dos nossos testemunhos históricos.

E depois, com o passar dos anos, se não se preserva o património, ele acaba por desaparecer. Pensemos, por exemplo, no saudoso velho cinema, ou no edifício da velha “Cadeia”, onde supostamente, se não estou em erro, terão funcionado os Paços do Concelho de Alhos Vedros que faz pouco tempo foi destruído para dar lugar a casas de habitação.

Em nossa perspectiva, torna-se necessário que a edilidade, para lá de desadequados interesses políticos e velhos mecanismos de preservação do poder, apoie incondicionalmente todos os agentes individuais ou colectivos, que se têm ocupado em dar visibilidade ás riquezas locais, culturais e artísticas, muitas vezes com prejuízo pessoal e profissional. Afinal, o interesse na construção de uma boa qualidade de vida na região é de todos, sem excepção.

Também é verdade que não estamos no deserto e muita coisa tem sido feita. Refiram-se, por exemplo, as boas notícias dadas no “Encontro”, pela senhora vereadora da cultura, sobre a recuperação do Moinho de Maré de Alhos Vedros, ou da aquisição por parte da Autarquia do Palacete do cais Velho que passou a ser propriedade da Câmara Municipal.

Aliás, por todas as razões apontadas atrás, temos aqui um magnífico lugar neste Palacete para definitivamente construirmos um Museu Municipal. O Concelho da Moita deverá ser o único do Distrito que não tem um Museu. É um défice enorme no panorama cultural do Concelho que temos de considerar. Eu avanço com uma sugestão: Agora que isso se tornou possível, penso que o espaço indicado para a construção do prometido espaço museológico será o Palacete do Cais Velho de Alhos Vedros. Não haverá outro sítio no Concelho, onde se respirará com mais força os ecos da nossa história.

Depois do muito trabalho já desenvolvido, torna-se urgente que se dê visibilidade junto da população dos materiais já desenterrados, escritos, edificados. Uma população que não conheça o seu passado nunca dará boa conta da sua identidade. Temos entre mãos um conjunto enorme de riquezas em que tardamos a dar o devido valor. O nosso património histórico, arqueológico, cultural, artístico (e desportivo, apesar de tudo), é vasto e riquíssimo. Não há mais tempo a perder.

Luis Santos
Professor da Escola Superior de Educação de Setúbal
in, Foral 2014 - Revista da AliusVetus, Associação Cultural, História e Património, nº1, Dez. 2007.

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